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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2001 Vicki Lewis Thompson

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

Algo selvagem, n.º 1 - Avril 2014

Título original: Notorious

Publicada originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

Publicado em português em 2003

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Paixão e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5155-9

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

1

 

Meninas! Meninas! Meninas!

O painel publicitário do Salão Pussycat iluminou-se por uns instantes com aquelas letras, antes de ceder o seu lugar a uma nova mensagem: Em cena...!

Noah Garfield passou ao lado e continuou até ao bar, que estava situado duas ruas abaixo do local de striptease. Só tinha parado um momento para contemplar as fotografias das mulheres em topless, que dançavam num interior escuro. A tentação sexual que lhe provocavam tinha-lhe parecido especialmente perversa dada a hora: mal eram duas da tarde.

De resto, essa tentação continuava a fazê-lo pensar em Keele, apesar de terem passado dez anos. Mal podia acreditar que tivesse passado tanto tempo desde que ela deixara os seus amigos de Saguaro Junction, Arizona, impressionados, ao aparecer despida no desdobrável da página central da revista Macho. No entanto, podia vê-la, exibindo-se em toda a glória dos seus dezanove anos, sorrindo-lhe a ele e a mais meio milhão de homens. Keele Branscon era assim.

Adoraria saber o que seria feito dela agora. Talvez estivesse casada e tivesse três filhos, embora lhe custasse imaginar isso. Provavelmente estaria a actuar num local exactamente igual àquele por onde tinha acabado de passar. Isso sim podia imaginar.

A despedida de solteiro daquela noite seria realizada num lugar semelhante e, na verdade, Noah não tinha vontade nenhuma de ir. As solas das suas botas ressoavam no pavimento. Tinham passado cinco anos desde a última vez que tinha estado em Las Vegas para participar num rodeo, mas lembrava-se muito bem de um bar que havia naquela zona. Era pequeno e acolhedor. Nada de danças nem de música alta: só cerveja fria e um par de antiquadas máquinas de moedas. O problema era que não conseguia encontrá-lo.

Tinha pensado em refugiar-se naquele bar durante o fim-de-semana, no caso dos festejos em honra do seu bom amigo Brandon ameaçarem deprimi-lo. Gostava e até se sentia honrado por ser padrinho. Sinceramente. O compromisso de Brandon e Jenny, anunciado apenas em Outono daquele ano, tinha-o feito lembrar-se que ele era o único do seu grupo de amigos que ainda não se tinha casado. Para cúmulo, o seu irmão mais novo, Jonas, tinha acabado de ficar noivo. E, entre todas as raparigas, tinha que ter escolhido a irmã de Keele, B.J.

Noah não se teria importado de casar. De facto, teria adorado. Mas tinha estado, e estava, demasiado ocupado com a quinta. Além disso, em Saguaro Junction, não abundavam jovens em idade casadoira. Agora que Jonas tinha assentado, talvez também ele tivesse tempo e oportunidade de arranjar uma esposa. Mas, entretanto estava ali, perdido na «Cidade do Pecado», quando se sentia especialmente vulnerável àquele tipo de tentações... Naquela cidade, podia-se fazer tudo o que se quisesse e aquilo era liberdade a mais para o seu gosto. Só estava ali há umas horas e já podia sentir a tensão sexual da cidade, o impulso de fazer coisas que jamais sonharia fazer na sua aldeia natal. E isso deixava-o nervoso. Keele tinha-lhe produzido aquele mesmo efeito, anos antes, e por isso, muito prudentemente, optou por evitá-la. Mas continuava a lembrar-se dela.

No cruzamento seguinte, parou para olhar à sua volta: lojas de bebidas, de lembranças... mas nem sinal do seu pequeno e acolhedor bar. Provavelmente tinha fechado. Com um suspiro, deu meia volta e encaminhou-se para o hotel. O hotel Tahitian tinha vários bares, mas eram todos demasiado barulhentos. O que Noah procurava era algo tranquilo, com música country. Era uma pena que um tipo com trinta e dois anos fosse tão calmo e caseiro, mas Noah Garfield era assim. Não se teria importado de estar naquele mesmo instante de regresso à sua quinta, para desfrutar de um maravilhoso pôr-do-sol. Amava a sua quinta tanto como a tinha amado o seu pai e o seu avô. Era a terra dos Garfield e Noah sentia-se sempre melhor quando tinha os pés plantados na terra.

Estava tão concentrado nas suas reflexões que não prestava atenção aos outros peões. Por isso demorou um bom bocado a perceber que a ruiva que caminhava em direcção a ele era muito parecida com Keele. Mas devia ser imaginação sua, tendo em conta que acabava de pensar precisamente nela. As flores azuis estampadas no seu vestido eram doces e inocentes, mas aquele mesmo vestido, curto e vaporoso, não era de modo algum inocente. Era um tecido flutuante maravilhosamente tentador, que realçava as suas longas e bem torneadas pernas. Calçava umas sandálias de salto alto e tinha as unhas dos pés pintadas de vermelho. Andava como Keele. Não, aquela não podia ser Keele. Mas era a sua irmã gémea: a mesma boca, lábios cheios, o mesmo queixo decidido.

Tinha óculos de sol, de maneira que não lhe podia ver os olhos. Os olhos eram a prova definitiva. Não havia mulher no mundo que tivesse os olhos de Keele. Havia quem dissesse que o verde era uma cor que descontraía. Mas em Keele não. Ela podia queimar o coração de um homem com um só olhar.

A mulher que era tão parecida com Keele parou à porta do local de striptease e Noah também. Claro que não era ela, mas tinha que certificar-se. Viu que tirava da mala uma pequena agenda de pele. Assim que a abriu, levantou os óculos enquanto lia as suas anotações. Depois fechou-a, voltou a guardá-la na mala e dispôs-se a entrar.

– Desculpe – abordou-a Noah, quase sem pensar. – Podia dizer-me as horas? – perguntou. Até cheirava como Keele.

Sem olhar para ele, a mulher consultou o seu relógio. E levantou a cabeça.

– São duas e... – parou bruscamente, contemplando-o.

O coração de Noah começou a bater a toda a velocidade. Aqueles olhos...

– Noah? És Noah Garfield, não és?

– Sim, sou eu – a surpresa tinha-o deixado atordoado.

– Uau! – deu uma gargalhada. – Não posso acreditar.

– Em que é que não podes acreditar? Sou eu quem não pode acreditar. Estava a pensar precisamente em ti e bum! Apareces de repente – rapidamente se arrependeu das suas palavras. Não devia ter dito aquilo.

– A sério? – os lábios dela curvaram-se num sorriso. – Estavas a pensar em mim ao fim de tantos anos? Que bom...

– Bom, eu... ah... – voltou a maldizer-se. Estava a corar.

– Talvez te tenhas lembrado de mim... – o seu sorriso ampliou-se... – Por veres esse letreiro que agora brilha sobre as nossas cabeças?

Como era habitual nela, sabia carregar nos botões adequados para deixá-lo nervoso.

– Bom, Keele, é melhor esquecer esse tipo de coisas, não achas?

– Evidentemente, tu não as esquecestes – estendeu uma mão para lhe dar uma carinhosa palmadinha no braço. – Está bem. Não é todos os dias que a rapariga que costumavas perseguir na tua aldeia decide aparecer completamente despida numa revista. Os rapazes de Saguaro Junction não estão habituados a esse tipo de coisas.

– Acho que a maioria já se esqueceu disso – mentiu Noah. – Bom, diz-me, como é que te têm corrido as coisas? – esta, sim, era uma pergunta original.

– Bem.

– Fico feliz – outro comentário brilhante. Tinha que admitir que tinha bom aspecto.

– E a ti? – perguntou ela.

– Bem também – perguntou-se que tipo de pintura para os lábios usaria para que estivessem sempre como se acabasse de humedecê-los. Não devia estar a olhar tão fixamente para aquela boca, mas era mais seguro fixar o olhar ali do que no resto do seu corpo.

– O que é que te trouxe a Las Vegas?

Noah teve que parar para pensar. Ah, sim, Brandon.

– Um amigo meu vai casar.

– Ah, sim? Eu conheço-o?

– Não me parece, é de Wyoming. Conhecemo-nos num rodeo há uns anos.

– E tu, Noah? Encontraste alguém que casasse contigo?

– Não. Tenho estado bastante ocupado – hesitou, não muito seguro de querer dizer-lhe mais alguma coisa. Afinal, tinha sido ela quem decidira cortar o contacto com toda a gente de Saguaro Junction, pai e irmã incluídos. Mas finalmente decidiu-se. – O meu pai morreu há dois anos.

– Oh. Lamento, lamento muito. Era um grande homem.

– Obrigado. Sim, era – não conseguia lembrar-se de alguma vez ter visto compaixão nos seus olhos. Desafio, sim, muitas vezes; malícia muito frequentemente e, numa noite memorável, desejo. Mas jamais aquela terna compaixão.

– Então, tu e Jonas tratam sozinhos da quinta?

– Sim – naquele momento sim. Há seis meses atrás não teria podido dar-lhe aquela resposta, porque naquela altura Jonas costumava passar mais tempo a perseguir mulheres do que a laçar vitelos. Mas B.J. tinha-o feito assentar a cabeça. – Essa é outra novidade. Jonas vai casar.

– Não me digas! – sorriu. – Assim, de repente?

– Não. Vai casar com a tua irmã.

Uma expressão de absoluta incredulidade apareceu nos seus olhos, para ser rapidamente substituída por outra de comovedora vulnerabilidade. Desviou o olhar.

– Bom, B.J. teve sempre um fraquinho especial por ele, mas receio que esteja a cometer um grande erro.

– Há uns meses, eu próprio teria concordado contigo, mas ficarias muito surpreendida, ao veres como Jonas mudou. Cada dia que passa vai-se tornando cada vez mais responsável.

– Que pena.

A inevitável irritação que sempre tinha feito parte das suas conversas com Keele voltou a assaltá-lo. Se toda a gente tivesse a mesma atitude despreocupada perante a vida, nada funcionaria devidamente.

– Ora, nesse caso eu fico contente pelos dois.

Keele lançou-lhe um insolente sorriso, como aviso do comentário cortante que viria depois.

– Não me admira. Tu já nasceste velho.

– Toda a gente acaba por amadurecer; mais cedo ou mais tarde – disse Noah, com o queixo tenso. – Inclusive tu.

– Não se poder evitar. E, quanto a B.J. e a Jonas, ambos tinham muito tempo antes de acabarem por cair numa rotina aborrecida. Mas não, apressarem-se a atar-se um ao outro e àquela bendita quinta. Detesto ver essas coisas.

– Ninguém te pediu que as visses – depois percebeu que aquilo tinha sido um golpe baixo. Não tinha querido dizer-lhe aquilo. Mas já não podia retirar o que tinha dito, nem sabia como atenuar o efeito do que acabava de lhe dizer.

– Não, ninguém me pediu – disse, magoada. Voltou a tirar os óculos e, quando voltou a falar, o seu tom de voz já não era tão seguro. – Imagino que o meu pai continue tão casmurro como sempre, não?

Noah comoveu-se por ter tido a coragem de perguntar por Arch. Durante a sua adolescência, Keele tinha tido discussões muito amargas com o seu pai e Arch praticamente tinha-a posto fora de casa depois do incidente da revista. Não tinha querido expulsá-la mesmo, mas ela, aos dezanove anos, tinha levado aquilo a sério. E depois daquilo nenhum dos dois tinha sido capaz de engolir o seu orgulho para retomar o contacto.

– Arch está bem – respondeu com um tom suave, calmo. – Tem uma saúde de ferro.

– Não me surpreende – disse Keele com uma careta, embora parecesse aliviada. – Acho que nunca toleraria a presença de uma doença na sua vida – ergueu-se. – Bom, agora que já falámos das últimas notícias, será melhor ir andando. Tenho uma entrevista.

Noah quase se tinha esquecido de onde é que estavam. Antes de abordá-la, Keele tinha estado quase a entrar naquele local de striptease. Teve um mau pressentimento.

– Uma entrevista? – perguntou, fingindo um tom indiferente.

– Sim. Uma entrevista.

– Oh – sentiu o estômago a encolher-se. Uma entrevista de trabalho. O desdobrável daquela revista voltou a assaltar a sua mente e compreendeu, sem a mínima dúvida, que se dispunha a pedir trabalho naquele local.

– Ouve, tenho um pouco de pressa. Gostei de te ver. Boa sorte, Noah – e virou-se para a entrada escura.

– Não entres aí – sem pensar duas vezes, agarrou-a por um braço.

– Porquê? – olhou-o, surpreendida.

– Há maneiras melhores de se ganhar a vida – ficou sem fôlego, ao sentir a branca e suave pele no seu braço nu. Lembrou-se que tinha uma pele maravilhosa. Uma pele que pensava mostrar diante de desconhecidos.

Com a mão que tinha livre, Keele tirou os óculos. Estava estupefacta.

– E como é que tu achas que ganho a vida?

– Eu... não tenho a certeza e, para ser sincero, preferia não saber. Só te estou a pedir que não vás a essa entrevista. Estive em lugares como este. Sei o que se espera das mulheres que...

– Ah, sim? Sabes?

Noah soltou-lhe de repente o braço, como se o seu contacto o tivesse queimado.

– Maldita sejas, Keele. Sabes bem do que estou a falar.

– Não digas isso. Custa-me imaginar Noah Garfield num local destes. Alguém te enganou para frequentares este tipo de lugares?

– Não! – aquela mulher acabava sempre por tirá-lo do sério. – Sabes? Não sou nenhum santo.

– Queres que te ponha à prova? – perguntou, a sorrir.

– Olha, Keele. Há alguns anos atrás, tu parecias decidida a levar a tua vida em certa direcção e não quiseste ouvir os conselhos de ninguém. Mas agora eu estou a pedir-te que... que penses. Talvez este encontro não tenha sido tão casual assim. Talvez tenha chegado a hora de pensares noutras opções...

– Vamos lá ver se percebo – um brilho de malícia espreitou nos seus olhos. – Em vez de entrar ali e arranjar um emprego mostrando as minhas... tu sabes, aos clientes, tu queres que me reforme e arranje um trabalho mais respeitável. É isso?

– Estás a gozar comigo, mas, sim, é isso.

– Queres salvar-me de mim mesma.

– Ah, raios, Keele. Não é que dançar em topless seja terrível. Sei que pensas que sou um puritano, mas não sou. E compreendo que tenhas querido sempre remar contra a maré. Mas não achas que isto está a durar demasiado tempo? Pensava que já te tinhas dedicado a outra coisa ao fim de tanto tempo...

– Nem sequer fiz trinta anos!

– Mas já não te falta muito.

– Dez meses, pelo menos. Quase um ano.

– Vês? É a idade perfeita para mudares – pensou que ela parecia muito mais nova.

– E a que tipo de trabalho é que me devo dedicar?

– Não tenho a certeza – esfregou o pescoço. – Mas, se pensarmos os dois, talvez nos lembremos de algo...

– E quando é que isso seria? Tu tens que ir a um casamento e eu preciso de viver entretanto.

Noah pensou que tinha um problema. Se Keele estava à procura de trabalho, era porque não andava bem de dinheiro. E ele não podia dizer a uma mulher como ela que esquecesse o dinheiro que ganhava a fazer aquelas coisas e que se dedicasse a... a servir à mesa. Rir-se-ia na cara dele. Mas não ia convencê-la de nada, se continuassem a conversar em plena rua.

– Há quanto tempo é que estás em Las Vegas?

– Cheguei ontem – respondeu ela.

– Ah – pensou rapidamente. Tinha que ir com cuidado. – Percebo. Acabas de chegar e precisas de um emprego, mas... não podias esperar um pouco para podermos falar sobre isso? Só o fim-de-semana. Eu podia pagar as tuas despesas durante estes dias...

– Referes-te a pagares-me um alojamento e comida? Nem pensar.

– Então, proponho-te uma coisa: deixa o quarto de hotel que reservaste e vem para o meu durante este fim-de-semana.

– Queres que me mude para o teu quarto? – olhou-o com um brilho de interesse nos olhos.

Aquilo soltou na memória de Noah uma recordação muito viva. Apenas com dezasseis anos, Keele tinha-o beijado com a paixão de uma mulher numa noite no celeiro da quinta.

– Só como amigos – apressou-se a esclarecer. – É um quarto grande. Eu durmo no sofá da sala e tu na cama, no quarto. Não se trata de uma proposta, Keele.

– Tens a certeza? – aquele brilho brincalhão voltou aos seus verdes olhos. – Sei que és um tipo discreto, mas já não estamos em Saguaro Junction. Ninguém de lá tem que saber disto. E já sabes a má rapariga que eu sou.

– É precisamente essa maneira de pensar que tens que abandonar de uma vez por todas – replicou Noah, corado. – A vida é algo mais do que sexo – sabia que devia haver mais coisas, embora naquele instante não se lembrasse de nada.

– Vamos lá ver se percebo. Estás a convidar-me para ficar no teu quarto durante este fim-de-semana, mas não tens nenhuma intenção de te divertires comigo. Em vez disso, vais... evitar-me.

– Exacto.

– Antes, perguntei-te se tinhas uma esposa à tua espera em casa e respondeste-me que não. Mas não haverá alguma namorada mais ou menos estável?

– Não – agora que pensava nisso, tinham passado meses desde a última vez que tinha saído com uma mulher.

– Noah, não és maricas, pois não? – ao ver a expressão dele, apressou-se a acrescentar: – Não, claro. Bom. Não estás comprometido com ninguém, não és maricas e não queres manter nenhum tipo de relação sexual comigo.

– Efectivamente – mentiu. Claro que queria ter relações sexuais com ela, tinha querido sempre, mas essa era uma mentira que não lhe provocava nenhum remorso.

– Então deves ser um santo que acaba de cair do céu para me salvar da minha própria maldade. Está bem, aceito.

Noah pigarreou e esforçou-se por aparentar mais confiança do que a que realmente sentia.

– Estupendo – agora que ela lhe tinha deixado muito claro que só um santo se atreveria a resistir-lhe, começava a arrepender-se da ideia que tinha tido. Mas, se podia arranjar força suficiente para manter as mãos quietas, então talvez Keele pudesse desenvolver uma nova imagem de si mesma. Afinal, o seu irmão ia casar com a sua irmã. Não demorariam a ser cunhados. – Talvez seja melhor ir buscar as tuas coisas.

– Oh... – pareceu subitamente preocupada. – A verdade é que... perderam-me a bagagem. Sabes, isso acontece muito nos hotéis.

– Oh – aquilo era pior do que o que tinha pensado. Evidentemente tinha inventado aquela história porque devia estar hospedada nalgum motel de má reputação e não queria que ele soubesse. Ou pior, os seus pertences eram tão escassos que tinha vergonha de mostrá-los. Talvez o vestido que trazia naquele momento fosse a roupa mais decente que tivesse... Mas esse facto mais não fez do que fortalecer a sua decisão de a tirar do poço onde estava. – Muito bem, então! – exclamou, consciente de que estava a mostrar mais entusiasmo do que o que era necessário. Parecia um maldito vendedor de carros usados. Pigarreando, tentou novamente. – Vamos para o meu hotel. Depois vou deixar-te algum dinheiro para comprares alguma roupa.

– Vemos isso depois. Mas, antes de irmos, quero entrar para lhes dizer que não vou à entrevista. Não quero deixar uma má impressão, no caso de precisar de voltar um dia.

– Vou contigo.

– Preferia que não o fizesses – disse-lhe, sorrindo.

– Porquê?

– Neste bairro, quando um tipo se pega a uma mulher dessa maneira, como se não quisesse perdê-la de vista, as pessoas imediatamente pensam que se trata do seu chulo.

Sentiu o sangue gelar-lhe nas veias, ao perguntar-se como é que tinha adquirido tanta experiência naqueles assuntos.

– Keele, por favor, diz-me que tu nunca...

– Não. Nunca. Posso ser uma má rapariga, mas nunca fui assim tão má... – ao ver que suspirava de puro alívio, acrescentou: – Pelo menos por enquanto.

Noah abriu a boca para lhe lançar outro aviso, mas ela calou-o, rindo.

– Calma. Estava a brincar. Conheceste-me durante os primeiros dezanove anos da minha vida, por isso devias saber como gosto de brincar com as pessoas. Sobretudo pessoas como tu. Espera aqui. Volto já.

Viu-a entrar no cavernoso interior daquele local. A incorrigível Keele. De repente pestanejou várias vezes, como se acabasse de sair de um transe hipnótico. Acabava de se comprometer a passar um fim-de-semana inteiro com Keele Branscon. Em que raio é que estava a pensar? Tinha chegado a Las Vegas num estado de penosa abstinência sexual. E depois convidava a mulher mais sexy do mundo para dormir no quarto do seu hotel. Estava ali há menos de quatro horas e a cidade já o tinha apanhado com as suas garras..