{Portada}

Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

© 2011 Kim Lawrence. Todos os direitos reservados.

LIVRES PARA O AMOR, N.º 1359 - Janeiro 2012

Título original: A Spanish Awakening

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em portugués em 2012

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

™ ®,Harlequin, logotipo Harlequin e Sabrina são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

I.S.B.N.: 978-84-9010-642-6

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

CAPÍTULO 1

Emilio bebeu um gole do seu café e fez uma careta de desagrado. Estava frio. Enquanto fazia o nó da gravata de seda com uma mão, bebeu o café e saiu pela porta. Com uma olhadela rápida para o seu relógio confirmou que, com um pouco de sorte e se o trânsito não estivesse muito mau, conseguiria chegar ao aeroporto a tempo para ir buscar Rosanna e estar de volta ao escritório às dez. Não costumava começar a trabalhar tão tarde, mas ser o chefe tinha os seus privilégios.

Havia pessoas que pensavam que a vida era feita de privilégios. Algumas iam mais longe, como a atriz que devia ter acompanhado à estreia da noite anterior, que o chamara egoísta, e aos gritos.

Emilio respondera ao insulto com um sorriso filosófico. Não se importava com a opinião que tinha dele. Nem sequer tinham ido para a cama juntos e duvidava que o fizessem, por muito que ela lhe tivesse telefonado depois, visivelmente envergonhada com o seu ataque de raiva, para se desculpar.

Os seus esforços para voltar a estar com ele tinham-no deixado tão indiferente como o seu ataque. Na verdade, provavelmente, tinha razão, talvez fosse um egoísta. E a possibilidade de ser assim não o incomodava muito. Não era precisamente essa a vantagem de ser solteiro, poder pensar só em si próprio?

Vantagem? Eram só vantagens! Não havia nada como não ter de se preocupar com o que outra pessoa queria.

No passado, cumprira com o seu dever e fizera o que os outros tinham querido. Ou mais concretamente o que o seu pai quisera. Essa docilidade levara-o a um casamento que fora um fracasso, sendo muito jovem, estúpido e tão arrogante que estivera convencido de que nunca fracassaria em nada.

Rosanna e ele deviam ter sido o casal perfeito: tinham muitas coisas em comum, pertenciam ao mesmo estrato social e, o mais importante de tudo do ponto de vista do seu pai, ela era de boa família, uma família de ascendência quase tão antiga como a dele.

Emilio sentou-se ao volante do seu carro e os seus lábios arquearam-se num sorriso amargo ao recordar os acontecimentos enquanto punha o cinto de segurança.

Luis Ríos ficara furioso quando aquele casamento auspiciado por ele fracassara. Recorrera a todas as ameaças de que dispunha no seu arsenal considerável, mas nenhuma delas conseguira intimidar o seu filho.

A sua raiva transformara-se em desprezo quando Emilio indicara como causador do fracasso o facto de aquele ser um casamento sem amor.

O seu pai suspirara com cinismo e perguntara:

– Amor? É disso que se trata? Desde quando és um romântico?

Emilio não estranhara aquela pergunta. Era verdade que sempre se mostrara condescendente e até depreciativo, com aqueles que acreditavam no amor. Mas isso fora até ao dia em que descobrira, muito tarde, que aquele sentimento não era o produto de uma mente febril, que era possível olhar para uma mulher e saber sem a menor sombra de dúvida de que era amor o que sentia.

Aquele instante ficara gravado a fogo na sua memória. Cada detalhe, desde que chegara, atrasado e cansado, a um jantar aborrecidíssimo, enchendo o ar carregado da sala de jantar com o cheiro daquela noite quente de verão.

O coração de Emilio parara literalmente, o que era absurdo com todas as vezes que a vira a entrar numa divisão. No entanto, naquele momento, fora como vê-la pela primeira vez.

Consciente de que estava muito perto da autocompaixão, Emilio cerrou os dentes e afastou o rosto daquela mulher da sua mente, permitindo que o do seu pai, muito menos agradável, o substituísse. Já não queria preencher o vazio no seu coração, aprendera a viver com ele.

«Não a perdeste», recordou-se. «Nunca foi tua.» A oportunidade passara ao lado dele, mas ele deixara-a escapar.

Mudou de mudança e contraiu o rosto ao recordar as palavras do seu pai quando lhe dissera que Rosanna e ele iam divorciar-se.

– Se o que queres é amor, procura uma amante. Ou várias – queixara-se, como se não percebesse como aquela solução não passara pela mente do seu filho.

Emilio olhara para o homem que lhe dera a vida e nem sequer o seu respeito por ele, pois nunca sentira afeto, conseguira evitar que o seu estômago desse voltas e que o sangue lhe fervesse nas veias, como se se tivesse transformado em ácido.

A simples ideia de fazer Rosanna passar pela humilhação que o seu pai infligira à sua mãe enchera-o de repulsão. Fora um casamento por conveniência, sim, mas nunca pensara em ser infiel a Rosanna.

– Como tu, pai?

Custara-lhe não elevar o tom de voz, mas não se esforçara para esconder a sua raiva e a sua repulsão.

Embora o seu pai tivesse sido o primeiro a desviar o olhar, durante o instante que tinham permanecido a olhar-se nos olhos, houve uma mudança profunda na relação entre ambos.

O seu pai nunca levara as suas ameaças de o deserdar a cabo, mas Emilio não se teria importado. Na verdade, uma parte dele teria desfrutado do desafio de começar uma vida longe do império financeiro que o seu bisavô criara e que cada geração aumentara.

Pouco depois daquilo, o seu pai deixara de intervir ativamente no negócio, retirando-se para a quinta em que criava cavalos de corridas, deixando Emilio ao leme com total liberdade para pôr em prática as mudanças que achara necessárias.

Mudanças que tinham protegido o negócio da crise económica que afetava o mundo inteiro. Os seus rivais, que ignoravam aquela reestruturação profunda que tinham feito, falavam com inveja da boa sorte dos Ríos.

E talvez fosse verdade que a sorte estava do seu lado, pensou Emilio, quando, depois de dar várias voltas, encontrou o que parecia o único espaço livre no estacionamento do aeroporto. E ainda faltavam dez minutos para chegar o voo de Rosanna.

Enquanto avançava pelo terminal para a porta por onde entrariam os passageiros do voo em que viajava a sua ex-mulher, Emilio passou junto de um grupo de controladores aéreos vociferantes com cartazes e alegrou-se por não ter ido lá para apanhar um voo. Nas caras das pessoas que estavam ali para isso via-se preocupação e indignação com a greve que estava a alterar o serviço, pensou, compadecendo-se delas.

A sua mente voltou para o motivo por que estava no aeroporto e suspirou ao recordar uma conversa que tivera no dia anterior.

Não via o seu velho amigo Philip Armstrong há quase um ano e a sua surpresa fora grande ao vê-lo entrar no seu escritório. E não fora a única!, acrescentou para si, com um sorriso irónico.

Escolheu um sítio de onde conseguisse ver bem Rosanna quando saísse e deixou que a sua mente voltasse àquela conversa.

– Tenho um problema – começara a dizer Philip.Hazel Jones Ele arqueara uma sobrancelha, pensando que não era preciso ser um perito em linguagem corporal para perceber que se passava alguma coisa com o seu amigo.

– Nunca fui tão feliz como até agora – acrescentara Philip, num tom fraco.

– Ninguém diria… – murmurara ele, com um sorriso.

– Apaixonei-me, Emilio – confessara Philip, com o mesmo desânimo.

– Ena, parabéns!

O seu amigo não se apercebera do tom irónico.

– Obrigado – balbuciara. – Enfim, tratando-se de ti, não espero que o entendas. Na verdade, perguntei-me muitas vezes… Bom, sabes.

– O que te perguntaste? – perguntara ele, sem compreender a irritação que se adivinhava nas palavras do seu amigo.

– Porque te casaste – concluiu Philip, amargamente. – Nem sequer estavas…

– Apaixonado? – adivinhara ele, sem perder a calma. – Não, não estava. Mas suponho que não vieste aqui para falar do meu casamento.

– Bom… na verdade, sim. Mais ou menos – confessara Philip. – A questão é, Emilio…

Emilio contivera a sua impaciência.

– A questão é que quero casar-me – confessara o inglês.

– Bom, mas isso é uma boa notícia, não é?

– Quero casar-me com a tua ex-mulher.

Emilio tinha fama da sua capacidade dedutiva, mas não adivinhara aquilo.

– Sabia, sabia que não aceitarias bem – murmurara Philip, num tom pessimista.

– Estou surpreendido, mais nada – respondera ele, com sinceridade. – Mas, mesmo que não concordasse, o que importaria isso? Há muito tempo que Rosanna não é minha mulher. Não precisas da minha bênção, nem da minha permissão.

– Eu sei, mas penso que se sente culpada com a ideia de ser feliz se tu não fores.

– Parece-me que estás a imaginar coisas – dissera Emilio, perguntando-se se não devia sentir-se um pouco ciumento.

A verdade era que não estava ciumento. Ainda sentia carinho por Rosanna, mas esse fora precisamente o problema, a única coisa que sentira por ela, tal como ela por ele, fora carinho. Ambos tinham pensado que o respeito mútuo e o facto de terem coisas em comum eram bases muito mais sólidas para um casamento do que uma coisa tão fugaz como o amor, um conceito puramente romântico.

Meu Deus! Como podia ter estado tão enganado? O seu casamento estivera exposto ao fracasso desde o princípio, era óbvio, mas, por sorte, Emilio não tivera de dizer a Rosanna que havia mais alguém. Um dia, só de olhar para ele nos olhos, ela soubera. Não sabia se por intuição feminina ou porque saltava à vista que se apaixonara.

Mas não conseguira escapar da sensação de culpa nem do sabor amargo depois do fracasso. Alguns teriam dito que era irracional, tendo em conta que a sua esposa fora infiel.

Desde criança, tinham-lhe inculcado que o fracasso era inaceitável para um Ríos. O divórcio não era só um fracasso, para o seu pai significava um fracasso público e ter de lidar com isso fora mais difícil do que ouvir a sua esposa a confessar que fora para a cama com alguém só alguns meses depois de terem pronunciado os votos.

Emilio fora muito mais tolerante com a fraqueza dela do que com a dele e o facto de ele não ter sido infiel senão nos seus pensamentos não o fazia sentir-se menos culpado.

Antes de enviar o comunicado de imprensa aos meios de comunicação social, cada um deles encarregara-se de dizer à sua família que iam divorciar-se, para os preparar. A reação do seu pai fora tão previsível que Emilio ignorara as suas críticas furiosas com desdém, o que irritara ainda mais o seu pai.

O que não esperara fora a reação da família de Rosanna. Aquilo fora um choque para ele, embora parecesse que não para ela.

Durante a discussão acalorada com o seu pai, descobrira que, nas suas costas, ele se comprometera a pagar à família Carreras, de ascendência nobre, mas pobre, uma enorme soma de dinheiro se a sua filha se casasse com ele e outra igualmente generosa quando nascesse o seu primeiro filho.

Emilio sempre pensara que Rosanna acedera àquele casamento por conveniência por pragmatismo. Só então é que se apercebera de que fora coagida e pressionada pelos seus pais.

Aquilo, certamente, explicava a sua reticência inicial quando ele sugerira que deviam divorciar-se. Naquele momento, ele não compreendera a sua atitude, mas depois compreendera que tinha mais medo de ser repudiada pela sua família ambiciosa do que de continuar a viver uma mentira.

Essa fora a razão pela qual, embora tivesse apoiado a versão oficial de ser uma decisão de mútuo acordo e de ser um divórcio amistoso, mas não fizera nada para negar os rumores de que fora uma infidelidade dele que causara a sua rutura.

No fundo não era uma mentira, embora não tivesse sido infiel e Rosanna tivesse tornado as coisas mais fáceis, já que, como compensação, pagara à sua família uma soma suculenta de dinheiro.

Os meios de comunicação social, que tinham adorado a notícia, tinham esperado, ansiosos, com os artigos preparados, certos de que, em breve, apareceria uma amante ou mesmo várias, mas isso não acontecera, porque a mulher que o levara a acabar o seu casamento nem sequer soubera o papel que desempenhara.

De facto, qualquer mulher com que o tivessem visto imediatamente depois do divórcio teria corrido o risco de ser etiquetada como «a outra mulher», por isso, para proteger a reputação da mulher por quem se apaixonara, decidira que o melhor que podia fazer era ser paciente.

Esperara um tempo prudente: seis meses. Seis meses para assentarem as coisas e para os meios de comunicação social se cansarem do assunto. O único problema que não previra que teria de enfrentar quando chegasse o dia em que acabasse a espera fora que não tinha experiência alguma em cortejar uma mulher. Sabia seduzir, mas nada a respeito de cortejar.

A ironia de tudo aquilo quase lhe arrancou um sorriso. Quase. Era difícil sorrir ao pensar naquele dia, no dia em que o seu orgulho ficara maltratado e o seu coração ficara destroçado. No entanto, cerrara os punhos, como um homem, e seguira em frente com a sua vida.

– Se te apaixonasses por alguém, tenho a certeza de que Rosanna deixaria de se sentir mal e se casaria comigo – dissera Philip.

Que ironia! Se ele soubesse…

– Sim… Por alguém em particular?

– Qualquer pessoa. O que importa? – replicara Philip, exasperado. Depois, ao ouvi-lo rir-se, apercebera-se do que dissera. – Desculpa – acrescentara, contraindo o rosto, – não falava a sério. O que se passa é que tenho a certeza de que Rosanna e eu podíamos ser felizes juntos, mas ela não é capaz de dar esse passo até tu estares com alguém.

– Bom, também não pode dizer-se que tive uma vida solitária nestes dois últimos anos.

– Eu sei e tenho a certeza de que a maioria dos homens te inveja. Eu invejava-te até recentemente – confessara Philip, – mas Rosanna acredita que não és suficientemente superficial para viver como um playboy. E eu também não acredito, naturalmente – apressara-se a particularizar.

– Ena, obrigado. Isso alivia-me – respondera Emilio, com ironia. – De modo que estás a pedir-me para me apaixonar para te abrir caminho. Tu sabes que seria um prazer fazer o que for preciso para te ajudar, Philip, mas isso…

– Eu sei, eu sei. Lamento muito. Não sei o que esperava ao pedir-te isto. A verdade é que não sei o que fazer – dissera Philip, com uma expressão desesperada. – Faria qualquer coisa por Rosanna, como cortar o cabelo, para começar…

Aquele comentário fizera Emilio rir-se.

– Isso impressionou-me.

– Não, a sério, quero assentar e deixar de dar trambolhões pela vida. Vou transformar-me num homem respeitável. Se Rosanna me pedisse, até trabalharia para o meu pai, transformar-me-ia num homem sério e seria o homem que ele sempre quis que fosse.

– E achas que isso poderia acontecer, que o teu pai…?

– Duvidas? Adoraria que voltasse com o rabo entre as pernas. Construiu um império para o legar ao seu herdeiro e sou eu – concluíra Philip com um sorriso, apontando para o peito com o polegar.

– Mas não és filho único.

Philip encolhera os ombros.

– Suponho que se Janie tivesse mostrado algum interesse pelo negócio familiar o meu pai não estaria à minha espera, mas nunca o fez, e não penso que o faça agora que se transformou na imagem daquela marca de perfume. Não sabes como é estranho ver a cara da minha irmã a olhar para mim quando abro uma revista ou quando passo à frente de um cartaz publicitário.

Emilio abanara a cabeça.

– Eu estava a pensar em Megan.

Ver uma figura familiar enquanto esperava que aparecesse a sua ex-mulher devolveu-o ao presente. Estava a pensar em Megan e de repente… Ali estava!

Embora parecesse ter emagrecido, coisa que Emilio não aprovava, não havia dúvida de que era ela, Megan Armstrong. Aquele encontro era suficiente para fazer com que um homem acreditasse no destino. Emilio não acreditava em sinais nem em forças cósmicas, era óbvio, mas costumava confiar no seu instinto e deixar-se guiar por ele.

Claro que, se o seguisse naquele momento, a única coisa que conseguiria seria acabar na prisão. Embora a verdade fosse que valeria a pena, pensou, ao mesmo tempo que um sorriso aparecia nos seus lábios e os seus olhos brilhavam, travessos.

CAPÍTULO 2

– Mas preciso de ti aqui esta noite!

Megan não se surpreendeu com o tom de suprema irritação na voz do seu chefe e pai.

Charlie Armstrong não se tornara milionário permitindo que pormenores, como uma greve de controladores aéreos, se interpusessem no seu caminho e esperava que os seus empregados, e ainda mais ela por ser sua filha, vencessem qualquer obstáculo para cumprir os seus desejos.

– Lamento muito, pai.

– E do que me serve que lamentes? Preciso…

– Eu sei, mas não há nada que possa fazer – interrompeu-o Megan, sem perder a calma. – Procurarei um hotel e amanhã apanharei o primeiro voo – prometera.

– E a que horas será isso?

Megan olhou para o seu relógio. Estava um pouco riscado, mas tinha um grande valor sentimental para ela porque fora da sua mãe, que morrera quando ela tinha doze anos.

– É uma greve de vinte e quatro horas, portanto, amanhã já deve ter acabado. O primeiro voo sai às nove.

– Às nove! Não, é simplesmente inaceitável.

– Aceitável ou não, pai, a menos que me cresçam asas, não sei como esperas que chegue aí, e antes de o sugerires, já não há bilhetes de comboio nem do ferry que atravessa o canal.

– Claro, as pessoas, que são mais inteligentes do que tu, adiantaram-se.

Megan conteve-se para não responder que, com toda a gente que voltava do Mundial de Futebol, era impossível encontrar bilhetes. Quando estava de mau humor, nenhuma desculpa lhe parecia aceitável.

Por isso, deixou que desabafasse à vontade durante mais alguns minutos, assentindo de vez em quando com monossílabos enquanto se deixava arrastar pela massa de passageiros que se dirigia como ela para a saída.

Encontrar um táxi ia ser um pesadelo, disse-se, preparando-se mentalmente. Talvez tivesse de acabar por passar a noite no aeroporto, deitada no chão.

– E não penses que vou pagar-te um hotel muito caro. O facto de seres a minha filha não significa que possas aproveitar-te da situação. Espero de ti o mesmo nível de compromisso que do resto dos meus…

Megan, que ouvira aquele sermão centenas de vezes, desligou mentalmente. Foi então que os seus olhos pousaram num rosto no meio da multidão e sentiu falta de ar.

– Oh, meu Deus! – exclamou, levando uma mão ao peito.

– O que foi? O que se passa?

Megan parou e um jovem que ia na direção oposta quase tropeçou nela. Desculpou-se, assustada, e quando voltou a olhar para o lugar onde vira aquele rosto, já não estava lá. Teria imaginado?, perguntou-se, olhando para ambos os lados.

– O que se passa, Megan? Aconteceu alguma coisa?

– Nada, pai, estou bem – mentiu ela, com o coração ainda acelerado.

– Não me parece que o estejas.

Megan sentia-se como uma parva. Num segundo, voltara a ser a rapariga envergonhada de vinte e um anos que fora da última vez que vira aquele homem, Emilio Ríos. Se não tivesse ficado paralisada, provavelmente, ter-se-ia virado e teria começado a correr, exatamente como acabara por fazer naquela ocasião.

Aquilo era uma loucura. Não via Emilio há quase dois anos e, provavelmente, ele até se esquecera dela e daquele encontro embaraçoso. Em qualquer caso, alegrava-se por ter sido apenas uma miragem.

– Não aconteceu nada, a sério, pai. Pareceu-me ver alguém, foi só isso. Olha, agora tenho de desligar, portanto, ligo-te depois de encontrar um hotel, está bem?

– Quem viste?

Megan respirou fundo e engoliu em seco, mas a sua voz era rouca quando pronunciou o seu nome.

– Emilio Ríos.

– Emilio!

– Bom, ou alguém parecido.

Estava em Madrid. Havia muitos homens morenos e de olhos castanhos, disse-se, e aquilo aliviou um pouco a tensão nos seus ombros.

– Bom, pode ser ele – murmurou o seu pai. – Tem escritórios em Madrid.

E não era o único sítio. Emilio Ríos, que segundo alguns era um génio das finanças e segundo outros era apenas um tipo com sorte, tinha escritórios em várias capitais do mundo.

Na opinião de Megan, para alcançar o êxito que ele alcançara era preciso ter ambas as coisas e ainda outro ingrediente essencial: ser implacável nos negócios.

– E têm uma quinta na serra, com um casarão impressionante do século passado – acrescentou o seu pai. – Convidaram-me há anos, quando o seu pai, Luis, e eu estávamos a negociar um acordo. Um tipo duro de roer, Luis Ríos. Chegaste a conhecê-lo?

– Sim e pareceu-me um snobe.

– Não, um snobe não – replicou o seu pai, irritado. – É um homem à antiga e tremendamente orgulhoso das suas raízes. E quem poderia culpá-lo por isso? A sua linhagem é muito antiga. Sabes, afinal, talvez a greve dos controladores não tenha sido assim tão má sorte.

Receosa, Megan franziu o sobrolho.

– Ah, não?

– Farei uma chamada a Emilio.

– Ah, não, não faças isso! – protestou Megan.

Mas, naquele momento, fizeram um comunicado, impedindo que o seu pai a ouvisse.